“Cidades Invisíveis” | Ana Paula Tavares

Ilustração para crónica. 2015

 

“Naquele ano a chuva foi excessiva…
As paredes das casas diluíram-se em nata e os oleiros desistiram de encomendar a sua obra a deus”
Ruy Duarte de Carvalho

Silêncio então, pois como disse o sábio, existem “cidades invisíveis” para lá da linha possível da areia, cidades onde se juntaram todos a falar as falas do lugar porque foi preciso deixar as falas dos lugares antigos. Silêncio pois, porque ali as casas cresceram mais do que o espaço e não constam em nenhuma cartografia, nem nos livros sábios que nos falam de terreno, das suas lamas e lodos e da teoria do sal e das salinas. Silêncio pois, a baía, a restinga, o ninho das ostras estão nos livros, embora estes nos falem menos de cruzamentos de caminhos, sítios de passagem, venda de escravos, álcool e fumo. Silêncio então, para recuperar uma primeira fala sobre esta cidade invisível que foi com a chuva que veio forte e sem controlo dos que sabem amarrar. Silêncio assim, sobre as estrelas que se apagaram dos nossos céus mesmo ali entre o mangal e o mar. A chuva choveu muitos dias e levou bloco a bloco essa ordem firme das casas que cresceram umas sobre as outras num tempo que é o nosso tempo. Silêncio, amigos, para podermos respirar estas noites ensopadas de tristeza. www.redeangola.info